sexta-feira, agosto 25, 2006

Competências de um Geógrafo

Este post vem a propósito de um comentário feito por um geógrafo (Paulo Moreira) a uma notícia por e que me parece oportuno divulgar e acrescentar mais qualquer coisa. A notícia está relacionada com o facto de o LNEC ir desenvolver um projecto para a criação de mapas digitais de risco que abrange as áreas metropolitanas do Porto e de Lisboa para permitir um maior controlo dos grupos de criminosos.
O comentário, feito por este Geógrafo é a seguinte: “De facto estamos num país de arquitectos, engenheiros, advogados e pouco mais. O resto é paisagem… No caso concreto assistimos a engenheiros a elaborar cartografia temática sobre áreas de risco para o combate à criminalidade. Concluo agora que um engenheiro serve para todo e qualquer serviço. Ninguém sabe ao certo onde começam e acabam as suas competências. Entretanto, outras áreas académicas ficam esquecidas e não saem do
marasmo pois não lhes é dada qualquer oportunidade. Enfim, só neste país.
Alguém sabe o que é um geógrafo? Acho que a maioria nunca ouviu falar e a minoria pensa que é alguém que lecciona e sabe tudo sobre países e capitais.
Pois bem, o tipo de projecto atribuído ao LNEC?!!! encaixa na perfeição no quadro de competências de um geógrafo (recolha de informação de dados relativos a actividades criminosas, elementos demográficos, urbanísticos, GPS, (…). O projecto, realizado no âmbito do programa “Metrópoles seguras”, está mais relacionado com a Geografia do que com a engenharia Civil, não concordam?
Deveríamos pois aprender com outros países onde o Geógrafo tem um papel muito diferente daquele que lhe é atribuído pelo nosso país. São inúmeros os exemplos onde equipas que desenvolvem este tipo de projectos (baseados num sistema de informação geográfica) são coordenados e integram estes profissionais. (…)”

Eu acrescento, que no nosso país fazem-se projectos onde quase sempre só entram engenheiros e arquitectos, esquecendo-se sempre, ou quase sempre, que existem profissões com mais competência para exercer determinadas funções, nomeadamente em estudos de impacte ambiental, em estudo geomorfologicos, geológicos… e aqui não falo apenas do Geógrafo.
Assim sendo, e para aqueles que consideram que as funções dum Geógrafo se baseiam exclusivamente ao ensino, e também para aqueles que não fazem a mínima ideia do que é ser Geógrafo. E porque nós temos orgulho em sê-lo e porque para quem não sabe, a profissão de Geógrafo foi umas das primeiras a ser reconhecidas no país aqui vai a explicação:
Os geógrafos estudam fenómenos físicos e humanos às escalas local, nacional ou mundial. Estudam a sua distribuição no espaço e procuram identificar os factores explicativos e as consequências dessa distribuição. A resposta à primeira questão é essencialmente descritiva; o estudo das causas e das inter-relações que explicam os padrões geográficos envolve teoria e análise. A geografia procura também interpretar os significados dos territórios, considerando, para o efeito, as dimensões identitárias dos lugares.
Com as informações recolhidas nos seus estudos, e após a análise das inter-relações entre os diversos fenómenos, os geógrafos elaboram estudos integrados, relatórios e mapas que caracterizam o espaço e os diferentes fenómenos físicos e humanos, emitindo pareceres e recomendações que são de grande importância no apoio às decisões políticas em variados sectores da sociedade, contribuindo com o seu saber e capacidade de interpretação do espaço para o ordenamento do território e para o desenvolvimento territorial equilibrado. Os seus trabalhos são particularmente utilizados na elaboração de Planos Regionais de Ordenamento do Território, Planos Directores Municipais (planos de ordenamento do território municipal) e no planeamento urbanístico, assim como na formulação e avaliação de políticas territoriais (locais, urbanas e regionais) ou sectoriais com impacte espacial (ambiente, economia, cultura, sociais, …).
A avaliação das situações de perigo e risco e os contributos para o ordenamento biofísico envolvem o estudo de fenómenos físicos. Neste sentido, são desenvolvidos trabalhos relativos à geomorfologia, o tipo de solo, as condições climáticas e a vegetação natural de determinada área. Estudam a evolução das formas de relevo – montanhas, vales, planaltos, …– e individualizam unidades geomorfológicas no território. Realizam, igualmente, estudos hidrológicos, especialmente sobre o funcionamento dos hidrossistemas (bacias hidrográficas e aquíferos). Os geógrafos dedicam-se, também, ao estudo e classificação das associações vegetais características de uma região: registam o tipo de plantas predominantes nos diferentes estratos (herbáceo, arbustivo e arbóreo) e a extensão de território que ocupam, classificando as associações segundo as suas características biogeográficas, como por exemplo as florestas (mediterrânica, equatorial, tropical), ou os ecossistemas agrícolas.
Em relação às condições climáticas, os geógrafos analisam, entre outros parâmetros, a variação da precipitação, a amplitude térmica, a velocidade e direcção dos ventos e a influência das altas ou baixas pressões atmosféricas. De acordo com as informações obtidas, cabe-lhes classificar o clima de uma determinada área em estudo, obedecendo às tipologias estabelecidas, assim como as suas diferentes cambiantes). O estudo do clima urbano – variações da temperatura, dinâmica particular do vento – e a avaliação do conforto/desconforto humano e a qualidade de vida nas cidades constituem os principais domínios de integração do clima no planeamento urbano.
Na perspectiva da análise da ocupação humana do território, geógrafos estudam as dinâmicas natural e migratória da população, o tipo de povoamento, as dinâmicas da rede urbana (metropolização, urbanização difusa, policentrismo, …), as actividades económicas e a distribuição dos equipamentos e infra-estruturas. Igualmente relacionada com a ocupação do espaço está a análise das actividades económicas desenvolvidas pela população. Neste âmbito, os geógrafos registam, entre outros, o tipo de agricultura praticado (produtos cultivados, máquinas utilizadas, extensão de terreno cultivada, etc.), a indústria existente (produtos fabricados, localização das unidades fabris, factores de produção, etc.) e a presença do sector terciário (localização, diversidade das actividades, segmentação, mercados, etc.). Efectuam, ainda, estudos de programação dos equipamentos sociais, tais como os estabelecimentos de educação, saúde, culto e lazer, bem como a distribuição das infra-estruturas, designadamente vias de transporte, comunicação e logística.
Apesar das inter-relações entre fenómenos físicos e humanos, é normal estes profissionais optarem por trabalhar apenas numa destas áreas. Podem, inclusive, especializar-se num determinado tipo de estudos: económicos (dotação de recursos, especialização da base económica e dinâmicas de inovação), sociais e culturais (a coesão social, a etnicidade e as vivências e práticas culturais), políticos (relação do território com os fenómenos políticos locais, nacionais e internacionais), urbanos e de transportes (organização das cidades e das áreas metropolitanas), rurais (desenvolvimento local e capacidade institucional) e ambientais e paisagísticos (planeamento biofísico e defesa do património natural ou construído).
Para executarem o seu trabalho, os geógrafos recorrem com frequência a técnicas de análise estatística e às tecnologias de informação e comunicação. É o caso dos sistemas de informação geográfica, que permitem obter, armazenar, classificar, tratar e analisar informação espacialmente referenciada, essenciais para a identificação e explicação dos padrões espaciais e para a construção de modelos vocacionados para a intervenção no ordenamento do território. Como tal, são cada vez mais utilizadas as ferramentas computacionais na análise geográfica.
Além disso, para ser geógrafo é conveniente possuir, entre outras características, curiosidade científica, gosto pela observação e capacidade para interpretar os fenómenos naturais e humanos, facilidade em usar mapas e propensão para o trabalho de grupo. De resto, esta é uma profissão em que é raro o trabalho individual: dependendo do estudo em curso, assim se constituem equipas pluridisciplinares com arquitectos, paisagistas, economistas, sociólogos, urbanistas, engenheiros civis, geólogos, meteorologistas, etc.

Saudações Geográficas
Liliana Azevedo

quarta-feira, agosto 23, 2006

Cabo Mondego vai ser Monumento Natural


Depois do post escrito no passado sobre o Cabo Mondego, hoje, este deixa-me especialmente feliz, porque parece que finalmente, e depois de mais de uma década, o Cabo Mondego irá em breve ser classificado como o sexto monumento natural Português, devido às suas características geológicas.
A proposta foi feita pelo Instituto de Conservação da Natureza e o procedimento administrativo inerente à classificação, (Decreto-Lei nº 19/93) passa por uma fase de inquérito público estará para consulta a partir de 8 de Setembro e prolonga-se até dia 20 de Outubro, sendo que poderá ser efectuada no Instituto de Conservação da natureza (http://www.icn.pt)/, na Câmara Municipal da Figueira, Junta de Freguesia de Quiaios, Junta de Freguesia de Buarcos e Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro.
Os interessados em participar no inquérito público poderão fazê-lo por escrito, através da ficha de participação que se encontra nos locais acima enunciados ou pelo endereço doaap@icn.pt.
A proposta dos limites já foi feita, bem como uma proposta de Decreto – Regulamentar, esperando que em breve o Cabo Mondego possa finalmente ser classificado tendo em vista a sua conservação e manutenção da sua integridade.
Relembro que o Cabo Mondego é conhecido pelos seus jazigos minerais jurássicos, um importante espólio de associações de fósseis, particularmente amonites e icnofósseis (com referências desde 1684). Por outro lado, a sua situação geográfica proporciona excelentes condições de observação e estudo, conferindo-lhe um elevado valor científico, pedagógico e didáctico.
Mas todo este processo de classificação como monumento nacional dos "Afloramentos Jurássicos do Cabo Mondego" não tem sido fácil, iniciando-se em 1978 no Serviço Geológico de Portugal. Em 1994 foi reiniciado com a apresentação formal de uma proposta de Decreto Regulamentar por ofício da Faculdade de Ciências de Coimbra (FCC) dirigido ao então Presidente do ICN, acompanhado por um extenso relatório técnico-científico. Seguiram-se uma série de iniciativas e acções com participação das três entidades envolvidas: Câmara Municipal da Figueira da Foz, ICN e Faculdade de Ciências de Coimbra.
Em 2003, foi aprovado, por iniciativa do município da Figueira da Foz, classificar o cabo Mondego como imóvel de Interesse Municipal. E só agora a sua proposta de classificação como Monumento natural.
Esta decisão é de louvar, mas peca por tardia, porque na verdade, uma parte importante do seu espólio já foi destruída, sobretudo devido à exploração da Cimpor que para produzir cal usa o mesmo calcário que encerra os vestígios fósseis do passado.
O que aconteceu foi um crime ambiental, que durou décadas, e que por interesses políticos e económicos se perdeu um património riquíssimo que jamais renascerá. Porque o Cabo Mondego, relembro, representa em toda a sua singularidade, raridade e representatividade o período da Terra entre 171 e 167 milhões de anos.
O que se espera agora é que jamais se cometem os mesmos crimes para que a história da terra perdure porque já não temos lugares de memória é precisamos de criar lugares de memória. Não se trata de avivar as memórias, o importante é criar ou recriar as memórias daquilo que terá sido a terra.
Se quiserem obter mais informações de todo este processo consulte a página:
http://portal.icn.pt/ICNPortal/vPT/
Lá poderão encontrar o Projecto do Decreto – Regulamentar, a ficha de participação e o Relatório Técnico de Fundamentação, entre outros documentos. Depois é só participar no inquérito público até dia 20 de Outubro do corrente ano.

Saudações Geográficas
Liliana Azevedo